terça-feira, 30 de agosto de 2011

Quando o J. chegou eu não gostei dele.

Quando ele chegou eu não gostei dele.



Eu era a única estagiária ali do sítio. Era a mais nova.
Quando ele chegou perdi o estatuto. Continuei a ser a mais nova mas as miúdas giras do andar de baixo tinham um estagiário. E era giro e vestia-se bem.
Eu não era tratada de forma especial mas desculpavam-me os erros básicos, depois dele chegar eu tinha de lhe explicar as coisas simples. Isso não era fácil e punha em causa tudo o que tinha ou não aprendido das formas mais básicas de sucessão no teatro.
Por isso a nossa relação era meia tímida. Eu no andar de cima todo o santo dia agarrada à máquina fotocopiadora. E uns olás tímidos e uns cafés no corredor.
Passado 1 mês, talvez nem tanto, já nos tinham casado.
Isso não foi muito confortável nem para um nem para o outro. Tínhamos lá as nossas vidinhas e não muita vontade de as partilhar. Mas acabámos inevitavelmente por fazer muitos serões juntos. Por andar no mesmo metro, por almoçar na mesma mesa. E de um dia para o outro já não sabíamos viver sozinhos.
Comecei a receber sms : "Então estás atrasada?! O que se passa?! " e comecei a enviar msgs a perguntar : "então?! demoras muito?! " .
Do nada eu sabia a vida dele, ele sabia a minha. Vivemos coisas felizes juntos, e outras bem más, ele foi o meu ombro quando me mostraram o lado mau da vida, e eu fui a caixinha de segredos. E fomos muitas vezes o penso rápido um do outro, a consciência que não pesava.
Ele chamou-me muitas vezes a mim. E eu dei-lhe força para ele apanhar um barco para outro lugar. Quando só me apetecia pedir-lhe para ficar no nosso porto de abrigo.

No dia em que ele foi embora deixou-me sozinha na nossa casa. No nosso teatro. Foi um vazio horrível. O meu amigo tinha-se ido embora.

Mas continuámos a viver. Na nossa distância dentro da cidade, na nossa concorrência cultural, continuámos a ser duas pessoas completamente diferentes. Que se respeitam muito.

Ele vai-me sempre chamar " Gomaça " apesar de eu não achar graça nenhuma. E vai sempre dizer " ai ai Gomes ". As perguntas que eu lhe vou fazer assim que o vir vão ser sempre as mesmas e as que ele me vai fazer já eu sei.

Ele vai sempre fazer de minha consciência, porque sabe tudo sobre mim. E eu vou sempre ralhar com ele por ser assim.
Ele sabe que me pode ligar a qualquer hora. E eu sei que se o encontrar na noite ele vai ter a boca preta
porque é viciado naquela vodka que nos deixa feios que dói. E vamos sempre fazer a maior festa do mundo como se não nos víssemos desde o ano passado.

Vamos fazer planos para o futuro. Os mesmos de sempre. Sempre.

Eu sei que ele é o meu Grande Amigo. Que seremos sempre os estagiários. Os miúdos.
E ambos sabemos que já passaram 3 anos e vamos deixando de ser crianças. Mas se nos der na cabeça ainda vamos ser os dois hospedeiros de bordo e conhecer o mundo.







Coffeeeeea? Teaaa?




2 comentários:

  1. olha que bom...;)(se o pássaro voltar...)

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  2. como tu sabes tão bem.. e tudo mudou naquela conversa no mmcafé
    - 6p.m. "queres ir falar lá fora?"
    - 8.30p.m. "até amanhã" :D

    eu e tu ainda havemos de ir visitar a Carol à Irlanda.

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