domingo, 27 de janeiro de 2013

O Amor É Fodido


De todos os livros que Miguel Esteves Cardoso escreveu e publicou só não acabei de ler "Escritica Pop".


Ontem voltei a ler " O Amor É Fodido. " 
Podia transcrever aqui todos os parágrafos. Mas escolhi estes :



"Quando estava contigo, só pensava noutras coisas. Nomeadamente: fugir. Não podia estar ali a ouvir dizer mal de mim. Não sabia discutir. Não acreditava em conversar. A tua única queixa era eu não estar lá quando tu querias. «Faz tudo menos fugir.» Mas eu não podia ir ter contigo enquanto tu continuavas naquele pranto, sem amor, de andar à procura de mim, só para me apanhar.
Cada um com a sua doença. A minha era não querer existir. Pensava que merecias melhor que eu, que te ias fartar de mim, que me ias descobrir. E afinal a única coisa que eu tinha para descobrires, à parte o meu grande amor, era a minha queda para a cobardia, e para ti." 


"Estou sempre a cair em ti, em vez de em mim. Só assim eu poderia tomar consciência da minha situação, pentear-me, deixar de beber e de me lembrar — e salvar-me. Mas é no meu amor, nos teus olhos de água suja, dum mar que não tem cabo, que eu caio cada vez que se deita o meu olhar."


"Precisava de fugir. Era uma necessidade constante. Se não
fosse o amor, de que poderíamos escrever ou fugir? Eu escrevia-te mentiras que eram quase verdade: que queria fugir para dentro de ti, invadir-te com fúria de te ver ininterruptamente, de não conseguir impedir-me de ficar ali parado a olhar para ti. Tu fazias pior. Ficavas calada e deixavas-te invadir. Atiravas os pulsos para as almofadas antes de eu poder fingir que tos ia prender. Mas era bom. Nota: era melhor assim.
O amor é fodido. Nunca sabemos se estamos a dar ou a receber. Os teus poemas também eram ricos. Transcrevo um de memória, para gáudio de quem nos estiver a ler: «A quem, a quem hei-de-me dar; eu que já soube o que dava e agora não sei mais nada? A quem hei-de dar a verdade que guardo tão mal, tal é o mal que ele me faz: dar-me vida e nada mais.»
Escrevemos coisas parvas, perguntas já previamente concebidas para obter respostas rápidas. Até parece que estamos a falar. Num dos nossos quartos. "

"O que custa mais não é tanto lembrar — é não esquecer. O que é que se faz com o que nos fica na cabeça, quando já não há nada para fazer?"

"«És um cabrão mas eu amo-te» havia tanto amor no «cabrão» como no «amo-te». A única palavra que soava mal era o «mas». O significado verdadeiro da frase é: «És um cabrão e por isso eu amo-te.» "

"Doida, mas dedicada, como se pertencesse às pessoas que a preocupavam.
«Ó que é que hei-de fazer contigo?» Estava sempre a fazer esta pergunta.
Eu respondia sempre: «Casa comigo.» Salva um suicídio. Dá esperança a uma geração. Cospe na cara da lógica. Confunde os peritos. Dá uma abébia aos bisbilhoteiros. «Casa comigo.» Vai contra o teu marido. Caga nos desígnios de Deus.
Diga-se que não casou — nem pouco mais ou menos. Com ninguém — valha-nos isso. Deu o colo a quem chorava por ela, nem que fosse só um bocadinho. Milhares de cabeças repousaram assim."

"Quero evitar o amor. Tal como quem anuncia que vai deixar de fumar, quero tomar publicamente esta decisão."

"É fodido. O amor é fodido. Esta é que é esta." 


3 comentários:

  1. O problema é que o amor é MESMO fodido

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  2. Já o li há tanto tempo, mas é lindo...
    É triste quando percebemos que não estamos no mesmo comprimento de onda, quando nos sentimos sozinhos no nosso amor, quando não somos vistos, pensados, sentidos... :(

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  3. Epah este é um dos meus livros favoritos <333
    É fodido né?

    eheh

    xoxo*
    IV

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